Família popular: mito ou estigma?
In: TRAVESSIA - revista do migrante, Heft 9, S. 5-9
ISSN: 2594-7869
A importância de estudar-se as múltiplas dimensões da questão familiar deriva em grande parte, do processo de modernização da sociedade brasileira em seu conjunto. Não há dúvida, a familia é o centro de convergência de todas as tensões sociais, além de ser o palco em que se realizam transformações radicais no que tange aos papéis sociais masculinos e femininos (papéis de gênero), à distribuição da autoridade, à aprendizagem da relação au- toridade/submissão, à sexualidade, e outras mais. Assim, quando a sociedade tradicional vai, pouco a pouco, perdendo as bases de sua vitalidade — sobretudo em decorrência dos processos de urbanização, industrialização e massificação da produção, da comunicação, do consumo e até mesmo do lazer —, a família sofre tanto efeitos diretos quanto indiretos. Em consequência, aumenta a tensão interna entre seus membros, ao mesmo tempo em que o grupo familiar vai assumindo nova conformação e nova dinâmica, ade- quando-as aos padrões modernos de comportamento individual e social. Destarte, é natural que a tentativa de melhor compreender a sociedade e os cidadãos contemporâneos, aqui e acolá, tenha acabado por fazer renascer as investigações sobre a organização e a dinâmica familiares. Não obstante a relevância dos estudos realizados até agora na área, a maior parte deles tem em comum o viés etnocêntrico: investigam grupos familiares no interior de uma camada — de preferência nas camadas médias e altas —, e passam a supor o padrão encontrado como típico daquela sociedade; o padrão de referência. De tal maneira que, à semelhança do narciso, o que lhe é igual ou semelhante é família; o diferente é não-famí- lia ou, no mínimo, família em estado de desorganização ou, ainda, na linguagem corrente, família desorganizada. [...]